quarta-feira, dezembro 09, 2009

O velhinho do cais


Renata Lopes
O velhinho estava no mesmo lugar de costume, sentado em sua cadeira branca. Olhava o rio correr e só. Tinha uma visão privilegiada. Aquele rio já foi vida, foi fartura. Foi forte, como ele mesmo em sua juventude. Mas já não eram os mesmos. Hoje as margens estavam poluídas pelo crescimento da cidade e as águas ralas continuavam correndo insistentemente no resto de vida que lhe mantinha.
A visão não era ruim. Outrora fora melhor, mas aquele velhinho não se lembrava de ter tido tempo ou interesse para numa manhã de terça feira, sentar em sua cadeira, próximo ao jardim da frente de sua casa, e observar o curso do rio. Não. Não tivera tempo. Mas o que era o tempo agora?
Já caminhava a passos lentos. Movia-se um pouco curvado, com a ajuda de uma muleta com os olhos azuis - não tão brilhantes quanto costumavam ser - atentos a cada passo. Não ia longe. Já não tinha a mesma disposição. Voltava logo, sentava no mesmo lugar e ali ficava por horas.
Não gostava da televisão. Ouvia o jornal pelo radinho de pilha antigo, daqueles que não se encontram mais. Chamava os mais novos de filhas e filhos. Olhava para as moças bonitas, mas com o cuidado e o respeito de um menino inocente que tem medo de ser pego espiando. Falava pouco, quase nada. Não por tristeza ou desinteresse, mas por ter aprendido a ouvir e observar mais.
Ficava ali vendo o tempo passar mais devagar do que parecia antes. Aliás, de sua passagem já não entendia muito. Quanto mais teria? Amanhã se sentará para pensar, se ainda tiver tempo.